No dia em que a minha companheira de quarto tomou banho, eu não tomei, mas enquanto a banhavam eu tentei levantar-me para fugir dali e ir tomar banho sozinha sem ninguém para me empecilhar. Estranhamente, as minhas pernas não me obedeciam. Tinha-me esquecido que tinha as duas pernas partidas!
E desta vez não tomei banho. Mas gelei quando a ajudante de lar olhou para mim de soslaio e percebeu que estava acordada. Com alguma admiração disse-me:
-Já acordada D. Ana Laura? Com algum sarcasmo respondi:
- Impossível não estar, o seu bom dia ouviu-se pelo menos no quarto ao lado! Pensei que também eu usufruía do seu bom dia!
- Ah! Desculpe acordei-a! Já é o hábito, nem nos damos conta do nosso tom de voz. Desculpe! E lá foi ela acordar e dar banho a mais não sei quantos. E é assim diariamente!
E sábado lá tomei banho. Se lá estivesses tinhas-te desfeito em lágrimas, não sei se a rir se a chorar e a tua boca bateria no chão e daria para passar quatro carris de comboio.
7h 30 da manhã!
- Bom dia D. Ana Laura vamos a acordar. Completamente estremunhada, dei um salto, abri os olhos e o meu coração batia desalmadamente, não sei se de contentamento ou se queria fugir do meu peito.
- Vamos tomar banhinho? - Parecia que de repente tinha mudado o meu aspecto e tinha voltado aos meus 5 anos.
- Vamos lá ! E num abrir e fechar de olhos fiquei destapada, num ápice fiquei sem camisa de dormir e quando olhei para a porta de entrada do quarto estava completamente aberta! GELEI!
Ali estava eu toda nua, indefesa e a sentir a minha dignidade a fugir-me por entre os dedos. No corredor a empregada da limpeza passava, as ajudantes de lar andavam apressadamente e alguns utentes demoravam-se a passar em frente à porta do meu quarto, enquanto eu era esfregada sem conversa, sem saber que parte do corpo ia ser lavada e que movimentos eu deveria fazer para ajudar.
Pedi para fechar a porta e recebi como resposta:
-Por favor D. Ana Laura, na sua idade já não se tem vergonha, já não tem nada para ver, não se incomode isto é rápido!
Senti-me impotente e desrespeitada e de repente agarrei aquela mulher com toda a minha força e metralhei-a :
- Quem julga ser para opinar sobre mim ou o meu corpo? Porque lava e seca o meu corpo da mesma forma que lava e seca a louça? Você tem a certeza que é uma mulher ou é simplesmente uma máquina com duas mamas programada para dar banhos?
E de olhos bem postos naquela mulher que distanciava de mim apenas uns centímetro, percebi a frustração e a pequenez escondida por detrás da arrogância, que servia para ocultar o medo espelhado nas nódoas negras do braço e do pescoço.
Regina Lourenço
Assistente Social - Academia de Empreendedorismo em Serviço Social
Supervisão Profissional em Serviço Social na área do Envelhecimento e Empoderamento Profissional
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